O 8 de Janeiro é a Guernica do Bolsonarismo
O governo está sob ataque: pedidos de abertura de CPI, notícias crime, falas inflamadas e vídeos incendiários são direcionados contra o ministro da Justiça Flávio Dino. Longe de ser uma ação de esclarecimento, o objetivo desta articulação do submundo do Congresso é exatamente obliterar as investigações, obstruir a justiça e confundir o cidadão que testemunhou as cenas de selvageria no ataque aos Três Poderes naquele já longínquo 8 de janeiro.
Os fiadores do crime atuam sob duas linhas principais
concorrentes: uma facção considera que os ataques foram provocados por supostos
esquerdistas infiltrados, a segunda entende que foram mesmo bolsonaristas, ou
melhor, cidadãos indignados. Em comum as correntes sugerem omissão do governo
empossado há menos de dez dias por ocasião daquele incidente. Para eles o
governo Lula que não agiu para conter os criminosos, algo como dizer que a
culpa do estupro é da vítima que estava de minissaia.
Já se sabe que a responsabilidade pela segurança da Praça
dos Três poderes é do governo de Brasília, razão que ensejou o afastamento do
governador Ibaneis Rocha e a prisão do ex-secretário de Segurança do Distrito
Federal Anderson Torres. O secretário, diga-se de passagem, foi ministro do
presidente golpista Jair Bolsonaro. Na casa dele havia uma minuta do golpe, mas
nem isso convence a direita.
Sem rodeios, é preciso esclarecer que o consórcio de falsários tem um único propósito que é fruto de agendas plurais. Querem sim enfraquecer o governo, mas por motivos distintos. Os que participaram da articulação golpista pretendem se livrar da cadeia, ao passo que antigos aliados do bolsonarismo anseiam por lavar as próprias biografias. Atacar o governo Lula e implicar seu ministro na tentativa de golpe serve para estabelecer a narrativa de que Lula e o agora ex-presidente Jair Bolsonaro são exatamente iguais a ponto de um colaborar com a tentativa de golpe contra seu governo e assim colher dividendos políticos da posterior solidariedade.
Federico Finchelstein esmiúça este aspecto da nova direita em “Uma breve história das mentiras fascistas”: "Os líderes fascistas mais conhecidos do século 20 - de Mussolini a Hitler - consideravam a mentira e a verdade encarnadas em si mesmos. Isso estava no centro de suas visões sobre poder, soberania popular e história. No entanto, a realidade alternativa, na qual o verdadeiro e o falso são indistinguíveis, baseia-se na lógica do mito. No fascismo, a verdade factual foi substituída pela verdade mítica."
Foi assim que Jair incentivou aglomerações na pandemia, atacou o uso de máscaras e as vacinas contra a COVID-19 e depois posou como responsável por salvar vidas. Bolsonaro não precisa limpar o sangue das mãos para convencer seus apoiadores, para eles Jair é um mito, e como divindade dispõe de prerrogativas, poderes e pensamentos elevados demais para nossa compreensão. Tal como o Imperador na Constituição de 1824, “A Pessoa do Capitão é inviolável, e Sagrada: Elle não está sujeito a responsabilidade alguma ".
O ditador Francisco Franco seguiu o método anos antes de Jair castigar o mundo com sua existência. Após arrasar com os bascos de Guernica (o massacre imortalizado por Picasso em 1937), Franco e seus jagunços disseram que o genocídio era culpa dos comunistas. Trump é outro, atribuiu aos antifas a responsabilidade pelo ataque ao Capitólio em 2021. Por aqui as viúvas do Regime Militar repetem que o golpe serviu para conter a indisciplina nos quartéis e um suposto levante comunista. Nossos heróis deram um golpe e instalaram uma ditadura para evitar que o Brasil virasse uma ditadura...
Acresça ao contexto a recente polêmica em torno de joias que ainda não se sabe se foram presentes para o governo brasileiro ou pagamento de propina por certa venda de refinaria no Nordeste. E o que é mais evidente: um governo minimamente estável que corrija índices sociais mínimos e apenas mantenha a estrutura social e política de pé será mil vezes melhor que a experiência de quase morte que foi o Bolsonarismo. A direita sabe disso, não é por outra razão que quer derrubar Lula na base da rasteira e do carrinho por trás.[left-sidebar]