A Igreja não quer dar a César o que é de César

 

Mais cedo o Congresso Nacional aprovou o PL de autoria do deputado federal David Soares (DEM/SP), que livra as instituições religiosas do rol de devedores dos precatórios. O texto ainda livra as igrejas da aplicação das autuações feitas com base no dispositivo anterior, o que na prática livra o conjunto de denominações de uma dívida que chega perto de R$ 1 Bilhão com a União.


Não custa lembrar: as entidades religiosas são livres de impostos, mas ainda estão sujeitas ao pagamento de contribuições como a como a CSLL (Contribuição Social sobre o Lucro Líquido). Por mais surpreendente que seja, a pauta encontra pouca ou nenhuma resistência mesmo entre partidos de esquerda: a bancada do PCdoB, por exemplo, aprovou o PL de forma unânime, no PSB (Partido Socialista do Brasil) a maioria foi favorável. As únicas bancadas que votaram de forma unânime contra a vergonha foram o Novo e o PSOL (obviamente que por motivos muito distintos).


Este é daqueles assuntos espinhosos em que não há como fugir do óbvio: a realidade aqui é que a Igreja está se refestelando no mesmo lamaçal político que tantos empresários corruptos já se deitaram. Com a maior desfaçatez possível a Igreja evangélica brasileira prefere o caminho da indignidade, causando prejuízo ao erário público em nome da mais abjeta conveniência.


A dívida que está virtualmente perdoada (já que é do interesse do presidente para manter o apoio de seus principais aliados) fará falta ao erário. Pode representar pressão extra no sistema previdenciário, e por mais improvável que pareça é algo que causa desassossego na patética equipe econômica bolsonarista. Afinal de contas, até eles sabem o mínimo de matemática. O perdão da dívida representa perspectivas menores para a União. De nada adianta os amigos do poder contentes enquanto a água inunda o barco por outros meios. 


Segundo noticiado pela imprensa, a ideia não foi formulada ontem. O assunto chegou a ser discutido em uma reunião arranjada por Bolsonaro em Abril com o pastor R.R Soares (pai do deputado autor do projeto) e o secretário especial da Receita José Barroso Tostes Neto. O assunto também foi alvo da aliança entre RR Soares e Eduardo Cunha, cujo empenho pessoal se desdobrou na aprovação do isentando valores pagos em forma de ajuda de custo de moradia, transporte e formação educacional segundo registra o UOL. Ocorre que época a Receita aplicou um drible da vaca nos avarentos exigindo comprovação dos gastos e aplicando multas em quem não apresentava os documentos. 


O cenário é triste por diversos ângulos: de um lado temos a Igreja como protagonista de prejuízos aos cofres públicos enquanto o pequeno empresário tem seu couro arrancado pelo governo, uma vez que não possuí a mesma proximidade que aqueles muitos empresários inescrupulosos e pastores puxa-sacos. Do outro a tristeza que dá ver o silêncio de muitos que se dizem contrários a estas práticas mas se calam quando este tipo de benefício é conquistado. Não se ouviu até aqui nenhuma grande oposição ao projeto por parte da Igreja Católica ou dos muitos reformados que se colocam como opositores da loucura neopentecostal. Estão todos calados, já que de um modo ou de outro eles também podem participar do banquete espúrio.


Não há que se dizer que pagar contribuições para a União representa algum empecilho para o evangelho, não quando o próprio Cristo determina que dê a César o que é de César. Nossos pastores modernos resolveram deturpar a verdade, indo a César não como súditos, mas como aduladores. A ele se associam para dividir os nacos do poder e conspirar contra as ovelhas. A sorte de muitos é que Cristo não está aqui em corpo para expulsar os vendilhões do templo, o azar é que Ele voltará para botar fim nesta farra.[left-sidebar]


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