O incidente Leo Lins expõe a diferença entre meninos e homens


Qualquer sujeito com menos de quarenta anos já deve ter ouvido falar em Léo Lins em algum momento da vida. O natural é que, caso este contato tenha se dado nos idos de 2000 (quando a maioria era adolescente ou apenas jovem) que houvesse certa simpatia pela suposta irreverência. Se o cidadão tiver mais de trinta o imperdoável é não ver problema no que o artista em questão entende por humor e liberdade de expressão. Recentemente o "humorista" se envolveu em (mais) uma polêmica por conta de uma suposta piada envolvendo uma criança vítima de hidrocefalia e a AACD, por isso foi sumariamente demitido do SBT. 


Como não poderia deixar de ser, o episódio levantou o já cansativo debate sobre "os limites do humor". Bom, antes disso devemos analisar a situação pelos dois primas colocados: o empresarial e o comercial. 


Do ponto de vista comercial temos uma emissora que realiza anualmente uma maratona televisiva em parceria com a TV Cultura, cujo objetivo é arrecadar fundos para a AACD (Associação de Assistência à Criança Deficiente). São pouco mais de vinte e quatro horas de programação voltada a arrecadação de doações, com presença de artistas, autoridades, lideranças religiosas e relativa atenção da mídia. O mote é a assistência e promoção da cidadania para as pessoas com deficiência. A atração conta ainda com a participação de grandes anunciantes, sendo um dos principais (se não o principal) evento do calendário da emissora. 


Imagine o que se exige de um gestor que, diante disso, é surpreendido com uma piada asquerosa da parte de um funcionário? Um funcionário que atua há anos na televisão, com passagem por duas emissoras distintas. Um sujeito de quase quarenta anos que, apesar das gritantes obviedades, faz chacota das crianças atendidas pela atração e da própria entidade beneficente. Claro, a tal emissora tem lá suas responsabilidades. Por anos aturou o indivíduo mesmo ciente de suas "pidas" racistas, homofóbicas e outras tantas coisas. A emissora não se posicionou antes por estar confortável com as vítimas de ocasião. Foi esta leniência com o absurdo que deixou o suposto humorista tão a vontade para atacar a própria empresa por tabela. 


Do outro lado há a questão moral. Um indivíduo que, repito, se aproxima dos quarenta anos e arroga para si as mesmas premissas de um adolescente espinhento que desenha pênis nas cadeiras da escola. Este indivíduo confunde grosseria com manifestação artística e truculência com liberdade de expressão. Arroga para si o direito de ofender quem bem entende com um argumento que beira a sociopatia: vou te agredir porque é meu direito, se você reclamar é porque cedeu ao autoritarismo e tenta cercear minha liberdade. Quando finalmente suas ações delinquentes se desdobram em punição (branda, diga-se de passagem), o sujeito e seus seguidores alegam censura por parte do politicamente correto.


Do aspecto comercial a lição é que uma figura tão abominável pode até acrescentar números a audiência, mas o passivo que pode ser gerado por sua movimentação natural tem alta capacidade de combustão. A manutenção do adolescente calvo na emissora já é sinal claro de como aquela organização lida com a dignidade humana, tolerando um notório bully em seus quadros. Daí é necessária a famosa contenção de danos, deixando no local a marca de um vexame facilmente evitável. A credibilidade de um evento já tradicional pode ser arranhada de forma irreparável e mesmo a demissão do infeliz deixará uma marca para a posteridade. 


No aspecto moral (também legal e político), não há que se falar em censura. Léo Lins foi demitido por uma organização privada em busca de autopreservação. Aliás, Léo Lins deveria ser case nestes cursos de masculinidade que pipocam por aí como exemplo do que um homem não deve ser: imaturo, egoísta, covarde, mesquinho, sádico e sem qualquer traço de honra ou caráter. O que ocorre é o contrário, já que até alguns supostos defensores da vida saíram em sua defesa após quase duas semanas defendendo que uma menina de onze anos desse à luz. A defesa da vida para muitos se restringe ao nascituro, depois que a criança nasce ela pode ser alvo da violência policial, miséria ou da chacota sádica de tipos como Léo Lins.[left-sidebar]

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