The Send merece críticas, mas críticas certas





Um vídeo publicado pelo teólogo e ativista  Jackson Augusto no Intercept Brasil conseguiu levar o The Send aos trending topics do Twitter por uma série de críticas disparadas contra a conferência. O The Send decerto merece críticas, mas talvez não sejam aquelas que o Jackson formulou. No vídeo o colunista parte de pressupostos confusos, misturando a atuação de grupos e indivíduos alheios a organização do evento, atribuindo intenções e confundindo conceitos. O vídeo está disponível no Intercept, quem quiser pode conferir por lá. 

Antes de tudo convém deixar claro que algumas das questões levantadas por Jackson e por nomes como Ronilson Pacheco merecem a devida atenção, sobretudo pela forma como denunciam esta tentativa de confusão entre cultura eurocêntrica e cristianismo. Foi a cultura europeia que capturou para si a fé cristã, não o contrário. O resultado disso está na demonização de heranças culturais muito distintas que em práticas sadias da fé poderiam conviver pacificamente com o Evangelho. 

Inclusive no vídeo é abordado en passant a questão da evangelização indígena, considerada por muitos um dilema e por outros mera oposição mundana a propagação da palavra de Cristo. Na verdade o que temos aqui é a proteção destes povos garantidas pela Constituição para preservá-los de ainda mais perdas. Missionários e pastores não raro interpretam a evangelização como a conversão de almas e corpos, levando aos nativos não a fé redentora do filho de Deus, mas o pão fermentado pelos fariseus. 

A questão é fundamental porque, como sinaliza o próprio Jackson, isto é por si uma prática racista. A mensagem de Cristo servia ao grego e ao etíope, ao judeu e romano sem representar com isso uma ruptura com a tradição cultural, mas uma contribuição ao pensamento daqueles indivíduos convertidos que por suas práticas resplandeceriam o caráter Dele.

Sem me estender muito neste ponto, poucas coisas são tão lamentáveis como o caso do "ex-pajé" Perpera Suruí, destronado da autoridade de sua tribo por missionários e sujeito ao ostracismo dos seus por gente que confunde Deus com branquitude. Aquilo foi um crime. Gostaria inclusive de perguntar aos distintos irmãos onde é que está escrito que seguir a Cristo é destruir por completo uma cultura e obrigar indivíduos a seguirem códigos de vestimenta.

Mas enfim, Jackson se perde ao confundir o cristianismo cultural com o Evangelho, ao sugerir que a mera pretensão de levar a palavra é criminosa por si. O próprio Jesus disse: "Ide por todo o mundo, pregai o evangelho a toda criatura" (Marcos 16:15), bastaria se concentrar no que ele determinou e não no acréscimo venal de quem confunde isso com terno e saia.

Outro ponto estranho no vídeo é quando ele critica o acréscimo político do The Send. De fato há uma mistura espúria entre a Igreja e a direita conservadora sobretudo nos últimos anos, e isto fica claro quando o próprio Jair Bolsonaro utiliza o evento como palanque ao lado da terrível Damares Alves. O que não é correto é estabelecer que todos os integrantes do evento comungassem desta visão ou que todo o movimento evangélico moderno se resume ao proselitismo de extrema-direita. 

O caso é que há uma confusão entre o que Jackson chama de conservador: em sua boca o rótulo se aplica tanto aos que são de fato conservadores quanto aqueles que apenas comungam da ortodoxia. Estes últimos, é claro, podem estar a direita e a esquerda no debate público. Não quero ser injusto, mas mesmo concordando que algumas críticas de Jackson possam parecer corretas a primeira vista, o fato é que ele parece flexibilizar um pouco a interpretação teológica em alguns pontos, politizando questões e atrelando conceitos. Isto é um mal caminho, afinal de contas o Evangelho é palavra de Deus e seu norte é Cristo e a Redenção do Homem. É o princípio e o fim, não mera filosofia política ou prática espiritualista. Este caminho inclusive é o mesmo que bolsonaristas e trumpistas  trafegam pela contramão, já que colocam a adesão a extrema-direta como pedágio entre Cristo e a Igreja. Isso é ruim. Como diria Jorge Ben, "Take it easy meu irmão de cor".[left-sidebar]
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